quarta-feira, 9 de abril de 2025

O que aprendi (e o que desaprendi) em um ano de meditação

 

Meu nome é Daniel, tenho 43 anos de idade. Sou uma pessoa que sofreu com algumas crises de forte ansiedade durante a vida, desde a adolescência, todas elas sem motivo aparente.

Esses mecanismos de defesa exagerados da minha mente causam muitas vezes angústia, frustração e tristeza, de forma que resolvi, há cerca de um ano, enfrentar a situação. Existem algumas situações específicas cotidianas em que a ansiedade aparece e me causa muito desconforto. Como essa situação acontece há muitos anos, pensei: - não quero morrer com isso, vou resolver o problema de uma vez por todas! A partir daí, resolvi agir. Vou descrever todo o processo de maneira muito resumida.

Como um homem contemporâneo normal, a primeira ação que fiz para enfrentar a situação foram diversas pesquisas no Google, sobre como acabar com a ansiedade. Dentre todos os resultados, três soluções despontaram como as mais populares e eficientes: terapia, medicamentos psiquiátricos e meditação.

Me chamou especial atenção a meditação, por ser uma solução recomendada por não gerar efeitos colaterais e ser barata (gastando apenas o tempo de prática). Pesquisei em alguns sites sobre o tempo em que demora pra meditação fazer efeito, e vários deles citam um número mágico: 8 semanas.

Pois então me organizei, não havia tempo a perder, eu precisava resolver o problema em tempo recorde, então decidi começar já com 40 minutos de meditação diária, incluindo finais de semana, haja o que houver, custe o que custar. Comecei a prática, sentia muita dificuldade de permanecer imóvel, olhava para o relógio algumas vezes durante o processo, me mexia algumas vezes, alterava meu ritmo respiratório durante a prática. No final de semana, deixava meu filho e minha esposa brincando e saia pra me fechar em um quarto meditar. Esforçava-me bastante, era uma atividade cansativa, mas tudo valeria a pena porque, afinal, em 8 semanas eu seria um novo homem.

Passaram-se as 8 semanas e não aconteceu praticamente nada, eu não mudei e as situações de desconforto ainda estavam lá. Então aprendi a primeira lição importante:

1 – A meditação não é uma solução mágica que vai resolver todos os problemas da sua vida em 8 semanas.

Então, como a meditação não cumpriu o que os sites da internet prometiam e a mágica não aconteceu, resolvi procurar um terapeuta. Achei um psicanalista. Pesquisei mais uma vez na internet quanto tempo demora para a terapia fazer efeito na diminuição da ansiedade e a resposta mais comum que aparece é… 8 semanas.

Continuei com as meditações e comecei a terapia. Mais uma vez gerei uma expectativa em relação às 8 semanas e me esforçava bastante. Como já escrevi antes, queria resolver o problema em tempo recorde, o que era um contrassenso, uma vez que a situação me acompanhava por décadas, então porque agora seria necessário (e possível) mudar tudo em semanas? Infelizmente naquele momento eu não me fiz essa pergunta.

Comecei a terapia, intercalado com meditação, trabalhando 8 horas por dia e tentando conciliar tudo isso com as necessidades pessoais do dia a dia. Porém, como acabei transformando um desconforto com situações cotidianas no maior problema do planeta, obviamente isso gerou ainda mais ansiedade sobre essas situações, o que acabou por gerar milhares de pensamentos obsessivos na minha mente em praticamente todos o momentos dos meus dias e o desconforto com o qual eu queria acabar acabou piorando muito. Insisti no processo (e na obsessão pelo processo) e acabei quase colocando em risco o meu casamento, de muitos anos. Não fosse a paciência, resiliência e esforço da minha esposa, talvez não estivéssemos mais juntos hoje. Até hoje não sei se esses pensamentos obsessivos que me colocaram na lona foram parte normal e necessária do processo de mexer com a mente ou somente um efeito colateral nocivo desse processo (talvez um pouco dos dois), mas de qualquer forma, o resultado disso realmente me assustou e e me levou a aprender mais algumas importantes lições:

2 – Desejos geram expectativas; expectativas são ilusões e geram ansiedade; ansiedade gera frustração; e frustração gera sofrimento (e ainda mais ansiedade).

3 – Não tente entrar em confronto aberto contra a tua mente, porque se você fizer isso ela vai acabar com você.

A psicanálise me levou a entender coisas importantes sobre o meu comportamento, sobre o motivo de algumas de minhas ações, mas, como fiquei bastante assustado com os efeitos colaterais do tratamento, resolvi então mudar o profissional da terapia, partindo para a Terapia Cognitivo Comportamental (TCC). E adivinha só, se pesquisar na internet ou em alguns livros que falam sobre TCC, se fala muito nas tais 8 semanas também para que se tenha resultados positivos em relação a problemas de ansiedade.

Comecei a TCC, continuei meditando. Melhorei um pouco a questão dos pensamentos obsessivos com algumas técnicas aprendidas, muito embora eles ainda estavam lá. Em relação às situações que me fizeram iniciar todo esse processo, não sentia melhora.

Nessa altura, já haviam se passado mais de 7 meses desde o início do processo. Eu entraria em férias do trabalho, então resolvi abandonar momentaneamente a terapia e parar com a meditação nas férias. Deixar a poeira baixar e tentar entender em que situação eu realmente estava. Percebi nesse momento algumas coisas muito valiosas que praticamente não são colocadas nos sites de internet, nos livros de autoajuda e nos anúncios de psicólogos e psiquiatras:

4 – Quando for mexer na tua mente, tenha muita cautela, isso não deve ser feito de maneira agressiva e nem gerando expectativas que possam se transformar em frustração, piorando ainda mais os sintomas.

5 – O processo de autoconhecimento não pode ser tratado como uma corrida de 100 metros, na verdade é uma longa maratona com muitos obstáculos, que devem ser transpostos com muita paciência.

Gostaria de fazer uma crítica a diversos livros, sites, vídeos e profissionais que falam de atenção plena, psicanálise, terapia cognitivo comportamental ou psiquiatria. Não se devem gerar ilusões nas pessoas que estão buscando diminuir sua dor. Isso só gera frustração e ainda mais dor. Quando se escreve sobre isso, deve haver uma responsabilidade gigantesca e todos deveriam deixar muito claro que esse processo não é fácil e não é rápido. Percebi lendo diversos livros e textos que a ansiedade é um sintoma de algo que está enraizado na nossa mente, mas também é uma patologia por si só, pois tem um componente genético muito importante, de forma que algumas pessoas terão que conviver com isso durante toda a sua vida, e não há fórmulas mágicas para lidar com a situação. Aparentemente, para diminuir o desconforto, deve haver muito trabalho, comprometimento, calma, autoconhecimento e aceitação.

Feita a crítica, sigo com minha história.

No final do ano de 2024 então interrompi o processo para tentar clarear a mente e pensar melhor sobre toda a situação. Na madrugada do dia 01 de janeiro de 2025, pouco depois da meia-noite, coloquei no rádio a música “Sujeito de Sorte” do Belchior e cantei junto: “Ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro”, como uma espécie de ritual de motivação.

Nos primeiros dias do ano, pesquisei um pouco mais sobre o funcionamento da nossa mente e descobri que o álcool é uma droga que age no sistema nervoso central e que, em um primeiro momento, alivia os sintomas da ansiedade, mas tem um efeito rebote muito importante que, após cessar os seus efeitos, piora esses sintomas. Então, percebi que, se estou me esforçando para diminuir os desconfortos causados pelos efeitos da ansiedade exagerada na minha vida, não faz sentido consumir uma substância que provoca exatamente o inverso do que estou buscando. Então resolvi no dia 09/01/2025 parar completamente o consumo de álcool, e foi o que fiz.

Durante o restante das minhas férias, organizei uma rotina de atividades semanais para cumprir quando retornasse com a minha rotina normal, que envolviam família, meditação, trabalho, alimentação, exercícios físicos e lazer. Reservei ao menos meia-hora por dia de meditação, de segunda a sexta-feira, uma meta que julguei mais adequada à minha realidade e que poderia ser executada de maneira mais leve em relação ao que eu vinha fazendo até então.

Após o término das férias, coloquei em prática a rotina elaborada. Comecei a meditar com muito mais tranquilidade, sem tanta inquietação e com vários momentos de satisfação durante o processo. O processo meditativo aos poucos foi se tornando mais leve a agradável, o que me levou a perceber algo:

6 – Se você praticar meditação como se fosse um compromisso rígido e com motivação obsessiva, ela não deverá te ajudar muito.

Óbvio que deverá haver um esforço e dedicação no processo, mas também deverá haver prazer e leveza, na dose certa, o que acredito variar muito de pessoa para pessoa.

Agora, depois de um ano do início da meditação periódica (com uma pequena interrupção no período de férias), a ansiedade continua aparecendo nas situações cotidianas específicas que motivaram o processo, o que continua me causando desconforto. Além disso, continuo tendo pensamentos compulsivos diariamente que me incomodam e tiram meu foco (em menor quantidade que há alguns meses). Entretanto, posso afirmar que houve algumas mudanças positivas em outros pontos da minha vida, posso dizer até o momento que “mirei no que vi e acertei o que não vi”.

Fui diagnosticado com hipertensão arterial há quase 20 anos, e, há cerca de 5 anos, comecei a sentir arritmias cardíacas diariamente, palpitações e batidas chamadas extrassístoles no coração. Nos sites e livros sobre meditação, há uma promessa de redução na hipertensão arterial com a prática frequente de meditação, entretanto, não percebi nenhuma mudança significativa nas minhas medições de pressão arterial. Entretanto, de uns meses para cá, as arritmias cardíacas sumiram completamente, simplesmente como se nunca tivessem existido, e isso sim me deixou bastante impressionado. Além disso, há algumas outras mudanças positivas que percebi:

- Consegui melhorar um pouco a minha concentração e o meu foco (embora ainda muito longe do que considero ideal);

- De uma maneira geral, me sinto menos impaciente no dia a dia;

- Senti melhoras no meu ciclo de sono. Ainda não consigo dormir a noite inteira sem interrupção, mas em vez de acordar praticamente de hora em hora, estou com ciclos de sonos médios de 3 horas de duração (e isso é bem significativo).

Enfim, como fica claro pela minha experiência, a meditação não é uma mágica que vai resolver todos os nossos problemas, mas é curioso que o simples ato de sentar e tentar manter o foco no corpo enquanto permanece imóvel possa causar alterações positivas no cérebro e na vida das pessoas.

A intuição me diz para continuar praticando, e é o que farei por enquanto. Talvez, na medida que eu me sinta mais confortável ou mude minhas rotinas de vida, possa modificar a quantidade e/ou a frequência dos exercícios de meditação. Isso vai depender da minha intuição e das minhas sensações.

Vou publicar esse texto no meu site abandonado e não vou divulgar, como quem joga um papel dentro de uma garrafa no oceano para quem sabe um dia alguém encontrar. Senti que deveria escrever isso e que poderia me ajudar no processo. A motivação foi egoísta mesmo, mas se você chegou a esse texto por qualquer motivo, espero que possa te ajudar de alguma forma também.

Fique em paz.